sábado, 12 de maio de 2012

Uniformes inteligentes: vigilância e educação

Recentemente, a prefeitura de Vitória da Conquista, Bahia, anunciou que os uniformes escolares da rede municipal seriam monitorados por etiquetas de rádio-frequência, de modo a notificar automaticamente os  pais dos alunos no caso de ausência. Conform a matéria no site da prefeitura: "As escolas municipais de Vitória da Conquista são as primeiras do Brasil a adotar o fardamento que facilita a comunicação entre as unidades de ensino e as famílias". A revista ComCiência do Labjor/Unicamp me entrevistou numa matéria sobre o tema. Reproduzo a entrevista na íntegra.
1. ComCiência: Qual a sua opinião sobre este fato?
Fernanda Bruno: O fato merece discussão. Na realidade, o uso de etiquetas RFID em uniformes escolares vem ampliar a presença crescente de tecnologias de vigilância e controle nas escolas. Projetos de lei requerem câmeras de vigilância em creches e escolas públicas. No setor privado, há creches que oferecem, entre suas “qualidades e serviços”, o uso de vídeo-vigilância com transmissão direta aos pais. Fora do Brasil, no Reino Unido por exemplo, já há experiências-piloto com uso de rfid em uniformes escolares.
Todos sabemos que a escola tradicionalmente utiliza uma série de técnicas e procedimentos para controlar seja o comportamento, seja a presença, seja o tempo, seja o desempenho dos alunos: inspetores, cadernetas, avaliações, campainhas, filas, exercícios. Estes procedimentos já estiveram inseridos num projeto disciplinar que orientou boa parte da pedagogia escolar durante anos. A escola vem passando por uma série de reformas e crises em todo o mundo e uma questão que eu endereçaria às instituições escolares é acerca do projeto educacional que sustenta tais medidas. Esta questão me parece importante porque, ao menos no material publicitário e jornalístico sobre o tema, tais dispositivos são em geral tratados como instrumentos neutros sem qualquer efeito além daqueles previstos pelas “boas intenções” de seus mestres. Assim, além de não se problematizar o vínculo histórico desses dispositivos com mecanismos policiais e/ou militares, não se pergunta sobre o sentido da presença desse gênero de dispositivo na escola. No caso da segurança pública por exemplo, ainda que o uso de câmeras de vigilância também seja questionável, temos alguma idéia acerca do projeto (no caso, de segurança) no qual eles estão inseridos. Mas qual é o projeto pedagógico que justifica inserir tais dispositivos na escola? A pergunta é tão mais relevante quando se pretende com isso “resolver” questões relativas ao comportamento, à presença, à relação da escola com os pais, entre outras. Por exemplo, qual é o sentido educacional e pedagógico de se utilizar câmeras de vigilância como instrumento disciplinar, visando coibir atos de vandalismo ou violência na escola? Por que a escola vê neste dispositivo um método mais interessante – do ponto de vista educacional – do que outros meios tradicionalmente usados? Essas questões indicam a necessidade de haver uma reflexão no plano educacional, pedagógico e não apenas num suposto – e inexistente – plano puramente técnico. É preciso sempre lembrar que esses planos – técnico e educacional – não estão jamais separados e devem ser pensados em suas interseções.
2. ComCiência: Quais os problemas de se tentar controlar a evasão escolar ou "facilitar a comunicação" entre escolas e pais colocando um código de barras nos uniformes dos alunos?
Fernanda Bruno: Considerando a questão específica dos chamados “uniformes inteligentes” com indentificação por radiofrequência (RFID), há também uma série de problemas em jogo. Vou me concentrar em apenas um deles, destacado nas matérias que li sobre o tema e retomado na sua pergunta. Um dos argumentos centrais de justificativa deste sistema é o de que as etiquetas RFID no uniforme possibilitariam, além de um controle mais efetivo da frequência dos alunos, uma melhor comunicação entre a escola e os pais que, segundo o site da prefeitura de Vitória da Conquista, poderão acompanhar melhor o dia a dia dos filhos na escola. O chip envia automaticamente uma mensagem ao pai informando que o aluno entrou na escola ou não, caso o aluno não passe pelo sensor até 20 minutos após o horário de entrada.
Uma primeira questão, mais evidente, é se este sistema de controle é de fato o melhor meio, em termos educacionais, de garantir a frequencia dos alunos na escola. Tenho sérias dúvidas quanto a isso e me parece que outras medidas, anunciadas no mesmo site da prefeitura – como transporte escolar gratuito e universalizado, merenda escolar bem cuidada, bom plano de carreira para os professores – sejam mais interessantes em diversos sentidos.
Mas o ponto que gostaria de discutir é outro, o da facilitação da comunicação, ou “interação” entre a família e a unidade escolar, para retomar os termos usados pelo site da prefeitura. Parece-me bastante problemático estender aos pais, em tempo real e de forma automatizada, a função de controlar a entrada e permanência dos alunos na escola. Certamente, a escola deve se comunicar com os pais seja em caso de falta, seja no caso de qualquer outro problema relativo ao aluno. Mas o “filtro” da escola, como instituição responsável pela educação escolar, é fundamental. Ou seja, uma coisa é os pais receberem da escola um comunicado que é fruto de uma “leitura” ou uma perspectiva desta instituição acerca de uma ausência, um problema de rendimento, de comportamento, ou qualquer outra questão. Quero dizer que a mediação da escola nessa comunicação é fundamental. Todos sabemos que há muitas maneiras de se “matar aula”, algumas mais e outras menos preocupantes. Cabe à escola avaliar quando e porque deve comunicar algo aos pais e não delegar ao “uniforme inteligente” essa tarefa, que por sua vez, requer dos pais uma vigilância própria a inspetores escolares. Quando o uniforme informa automaticamente e em tempo real a ausência do aluno, quem está fazendo essa mediação é o RFID, requerendo que os pais ajam, em alguma medida, como inspetores escolares, o que é muito problemático. Além disso, a margem de negociação entre os alunos e a escola, margem fundamental para o processo educacional, diminui drasticamente. Comparemos com a caderneta, outro instrumento de controle da frequencia escolar, do comportamento, do  desempenho; e também meio de comunicação com os pais. Mas mesmo na disciplinar caderneta, já em desuso em diversas escolas devido à forte e problemática mistura de comunicação e controle nela implicada, ainda há tanto uma margem para a negociação entre o aluno e a escola (quantos de nós, educados em sistemas similares, não negociou com professores ou funcionários notificações na caderneta?), quanto a mediação da escola – o professor, o diretor, o funcionário – na comunicação com os pais. O uniforme inteligente dispensa essas duas vias de negociação e de mediação tão importantes. Algo similar se passa com as escolas infantis que colocam câmeras para que os pais possam acompanhar o dia a dia dos seus filhos e se assegurar de que eles estão sendo bem tratados pelos professores e funcionários. O discurso que busca legitimar essa prática vai desde a feliz oferta de “tudo ver” e “não perder nem um segundo da vida do seu filho” até a aterrorizante garantia de que o seu filho não está sedo maltratado na escola. Mais uma vez, é claro que a escola deve zelar pela segurança das crianças, assim como deve manter diálogo constante com os pais. Esses por sua vez, também precisam ter uma relação de confiança com a escola. Entretanto, não é por meio dessa promessa de “transparência” que essas relações serão garantidas. Confiar, inclusive, implica não ver tudo, não saber tudo, não controlar tudo. É no mínimo inquietante que pais e escolas queiram educar crianças dizendo a elas que só estarão seguras e bem cuidadas se forem todo o tempo controladas e visíveis.

Privacidade 2.0: as relações eu-outro nas redes sociais


Na próxima semana, estarei participando do I Seminário do NEIFECS: Clínica de situações contemporâneas e interdisciplinaridade na UFRJ. Farei uma conferência no dia 16/05 às 17h00 na mesa "A relação eu - outro no contemporâneo" e me pediram para explorar, neste domínio, as práticas de exposição do eu e do outro na Internet. Espero postar algumas notas sobre a minha fala adiante, mas aproveito para inserir outras notas, passadas, que surgiram de uma outra demanda em torno deste mesmo tema. No fim de 2010, a Raquel Recuero me pediu para dar uns "pitacos" sobre estas práticas de exposição na Internet, levando em conta um incidente envolvendo a divulgação por twitcam de imagens de adolescentes transando.
Recuperei a "entrevista" que fizemos por e-mail e reproduzo abaixo:

Raquel Recuero: Na cultura atual vemos uma valorização do "público": Big Brother com sexo ao vivo, participantes do BBB e VJs da MTV que são famosos em redes sociais, vídeos de sexo de celebridades ... tudo é escancarado, tudo é ao vivo e tudo é público. Ao mesmo tempo, há uma imensa preocupação para com os adolescentes que me parecem, reproduzem esses valores, nesses sites de rede social. Como vês isso?

Fernanda Bruno: A questão tem muitos caminhos de resposta, pois há inúmeros elementos envolvidos nesse fenômeno de publicização ou exposição da vida cotidiana, íntima, privada etc.
Vou começar pela constatação mais evidente, já anunciada por diversos pesquisadores deste tema: as fronteiras entre o público e o privado estão em deslocamento. Mas o que não é tão evidente é que este deslocamento não é apenas no sentido de publicizar o que antes era resguardado no âmbito privado, mas no sentido de ressignificar esses domínios e, mais importante, pensá-los segundo uma outra topologia. Que topologia seria essa? Uma topologia que não delimita dois pólos (dentro/fora, aberto/fechado, exposto/secreto etc), mas que comporta múltiplas camadas, níveis, escalas. Ou seja: cada vez mais deixamos de pensar a separação público/privado de forma estanque para pensarmos em múltiplos níveis e modos de privacidade, assim como em múltiplos níveis e modos de publicização. Neste sentido, as opções de controle da privacidade/publicidade que encontramos nas redes sociais é uma expressão desta topologia e desta experiência. Regulamos, modulamos a nossa privacidade cotidianamente e selecionamos o que e como desejamos expor (ou não expor) para públicos ou audiências diferentes. Claro que no limite isso sempre existiu (ou melhor, desde que nossa experiência vital, política, institucional e espacial passou a ser orientada segundo essa distinção público/privado), mas agora essa modulação é extremamente corriqueira e intensificada.
Essa é a primeira observação mais geral e importante para encaminhar a nossa conversa. Paralelamente e atrelada a essa mudança topológica (que é também uma transformação no modo como experimentamos nossa vida privada e pública), eu adiciono 3 elementos, para ser breve:
I) Vivemos uma sobreposição de sentidos e valorações próprios à convivência de uma cultura da celebridade e do espetáculo (mais antiga, considerando nossa herança mais recente) com a cibercultura. A cultura da celebridade e do espetáculo nos legou um alto apreço pela visibilidade midiática, que, como sabemos, atestava reconhecimento social, afetivo, financeiro etc. Mas fazia parte dessa cultura e desse valor um certo princípio de escassez que de algum modo dizia “imaginariamente” que essa visibilidade midiática era para poucos, para um seleto grupo de eleitos. A cibercultura vem bagunçar esse regime de visibilidade e introduz outras formas, dispositivos, alcances para a visibilidade, agora supostamente “para todos”, mas não da mesma forma nem com o mesmo sentido e alcance. O interessante da cibercultura é que ela acolhe diferentes  regimes de visibilidade, e nela há tanto a reprodução da visibilidade midiática tradicional e sua lógica da celebridade, quanto outras vias de visibilidade cujas ações coletivas, políticas, cognitivas, estéticas escapam dessa lógica e, muitas vezes, até se fundam no anonimato dos agentes ou atores em jogo. Mas no tipo de fenômeno que você apontou, vejo nele um “locus” onde a cultura da celebridade e a possibilidade de produção, emissão e distribuição de conteúdo pelo usuário comum se retroalimentam. Creio que muitos adolescentes usam as novas mídias segundo essa lógica, buscando uma visibilidade que ateste um pertencimento social e afetivo que mimetizam de algum modo a celebridade. E no âmbito das redes sociais e da cibercultura, parte dessa visibilidade e desse pertencimento se conquista pela exposição (maior ou menor, segundos os níveis e camadas de que falei) da privacidade e da intimidade. Ou seja, vemos aqui a exposição seletiva da intimidade como motor de sociabilidade. O que também vemos em talks shows e reality shows na mídia de massa (embora os níveis de seleção, reconhecimento e pertencimento variem). Concluindo esse ponto, um dos elementos presentes nos fenômenos de publicização que você apontou está relacionado a essa sobreposição da lógica da celebridade com a lógica da sociabilidade pautada pela publicização seletiva (modulada, editada) da intimidade.
II) Um segundo elemento concerne à expectativa de exposição pública presente nas redes sociais (e outras plataformas digitais) ou em situações/ambientes que impliquem alguma forma de registro audiovisual (o que se tornou quase que onipresente com os nossos dispositivos móveis c/ câmera e áudio acoplados). Dentro dos padrões “convencionais” de um espaço que se entende público (praça, rua), as pessoas têm uma idéia relativamente clara e muito ancorada no contexto e na situação (no aqui e agora) do grau de exposição a que estão sujeitas – e modulam suas ações tendo em vista essa exposição. A expectativa de exposição é, neste caso, relativamente coerente com os limites daquele espaço. Nas redes sociais, essa expectativa de exposição é mais difícil de se estabelecer e muitas vezes não coincide com a exposição a que de fato se está sujeito. Os tais controles de privacidade nas redes sociais são de algum modo uma tentativa de “concretizar” essa expectativa (o problema é que eles nem sempre são muito evidentes nem simples de manejar, o que faz com que muitos não os usem, como mostram certas pesquisas). O mesmo acontece no caso das festas e situações sociais com inúmeros celulares presentes. Toco neste ponto por conta do caso da transmissão via twitcam de sexo entre adolescentes que mencionou. A expectativa de exposição da intimidade de alguns dos “atores” presentes parece não ter incluído este transbordamento para as mídias sociais, o que torna o caso muito cruel e grave do ponto de vista ético. Que adolescentes tenham prazer em serem filmados e testemunhados por amigos enquanto transam não significa que eles desejem ser vistos por milhares de pessoas, por seus pais, professores, uma cidade inteira etc. Aí o problema ético é o da exposição do outro.
III) O último elemento toca neste prazer em ver e ser visto. Acho importante perceber que não há apenas um mimetismo da celebridade, mas há uma excitação e um erotismo nessa troca social apimentada por exposições moduladas da intimidade. Ver pitadas da intimidade do outro e ser visto em sua intimidade é hoje uma das “zonas erógenas”, para retomar um termo psicanalítico, da sociabilidade contemporânea. Não há nada de novo aí, mas agora  isso se tornou mais visível e cotidiano e há ainda poucas pesquisas sobre o tema no âmbito das redes sociais. Mas, importante, é preciso não confundir esse desejo e essa excitação positivamente experimentada com um desejo de ser exposto a uma publicização que não se escolheu, o que é muito grave.

Raquel retoma partes desta entrevista no texto Teens, Social Media, and Celebrity: Anatomy of an Incident publicado no DMLCentral.

A imagem deste post reproduz a do artigo citado. Image Credit: http://www.flickr.com/photos/mburpee/4030741659/

A materialidade dos enunciados: Foucault e Teoria Ator-Rede


Um das minhas aulas no curso "A vida secreta dos objetos: tecnologia, cognição e materialidades da comunicação" se propôs a estabelecer um diálogo entre Foucault e a Teoria Ator-Rede. Abaixo, um trecho de A arqueologia do Saber (Foucault, 1987) sobre a materialidade dos enunciados:

"Poderíamos falar de enunciado se uma voz não o tivesse enunciado, se uma superfície não registrasse seus signos, se ele não tivesse tomado corpo em um elemento sensível e se não tivesse deixado marca - apenas alguns instantes - em uma memória ou em um espaço? Poderíamos falar de um enunciado
como de uma figura ideal e silenciosa? O enunciado é sempre apresentado através de uma espessura material, mesmo dissimulada, mesmo se, apenas surgida, estiver condenada a se desvanecer. Além disso, o enunciado tem necessidade dessa materialidade; mas ela não lhe é dada em suplemento, uma vez bem estabelecidas todas as suas determinações: em parte, ela o constitui. Composta das mesmas palavras, carregada exatamente do mesmo sentido, mantida em sua identidade sintática e semântica, uma frase não constitui o mesmo enunciado se for articulada por alguém durante uma conversa, ou impressa em um romance; se foi escrita um dia, há séculos, e se reaparece agora em uma formulação oral. As coordenadas e o status material do enunciado fazem parte de seus caracteres intrínsecos."
...
"Essa materialidade repetível que caracteriza a função enunciativa faz aparecer o enunciado como um objeto específico e paradoxal, mas também como um objeto entre os que os homens produzem, manipulam, utilizam, transformam, trocam, combinam, decompõem e recompõem, eventualmente destroem. Ao invés de ser uma coisa dita de forma definitiva - e perdida no passado, como a decisão de uma batalha, uma catástrofe geológica ou a morte de um rei -, o enunciado, ao mesmo tempo que surge em sua materialidade, aparece com um status, entra em redes, se coloca em campos de utilização, se oferece a transferências e a modificações possíveis, se integra era operações e em estratégias onde sua identidade se mantém ou se apaga. Assim, o enunciado circula, serve, se esquiva, permite ou impede a realização de um desejo, é dócil ou rebelde a interesses, entra na ordem das contestações e das lutas, torna-se tema de apropriação ou de rivalidade."

A vida secreta dos objetos: tecnologia, cognição e materialidades da comunicação


"A vida secreta dos objetos: tecnologia, cognição e materialidades da comunicação" é o título de um curso que estou ministrando na pós-graduação em comunicação e cultura da UFRJ, em parceria com os professores Erick Felinto (PPGCOM/UERJ) e Simone Sá (PPGCOM/UFF). A experiência de um curso coletivo envolvendo três professores e três programas de pós-graduacão em comunicação, além de muitos alunos, tem sido extremamente interessante.
Abaixo, a última versão do programa do curso, sempre "em construção". Tentarei atualizar  aqui as novas versões no caso de alguma alteração. A inspiração central deste curso foi o horizonte de realização de um colóquio previsto para o início de agosto de 2012. Em breve, postarei mais informações sobre o colóquio.
Ementa: 
O que os objetos têm a dizer (e fazer) ao pensamento? No recente campo da comunicação, a questão, que ecoa um imenso e antigo problema filosófico, só passou a ser enfrentada de modo mais sistemático a partir dos anos 1980, quando diferentes perspectivas retomam indagações que parte da tradição hermenêutica das humanidades obscureceu, tais como : o que é um meio e como se dão os processos de mediação?  Em que aspectos as materialidades tecnológicas informam mundos culturais e condicionam formas de cognição? De que modos a dimensão material da experiência se conjuga com as dimensões imateriais da cultura? Em que sentidos as categorias do humano, do pensamento, do corpo e dos sentidos se reconfiguram em face das nossas relações com os objetos e as entidades inumanas?
Tendo como eixo este conjunto de reflexões, este curso pretende discutir alguns autores desse campo de pesquisas recentes, bem como suas influências e alianças no âmbito mais amplo das ciências humanas e sociais.  Os quatro principais eixos de discussão serão: Teoria Ator-Rede (Bruno Latour e Michel Callon); Filosofia orientada aos objetos; Materialidades da Comunicação e Pós-humanismo. Retomaremos pontualmente, ainda, autores que constituem a matriz de problemas explorados nos três eixos, tais como Walter Benjamin, Michel Foucault, Gilbert Simondon. Focalizaremos, a partir dos autores e abordagens mencionados, as relações entre tecnologia, materialidade, conhecimento e discursos, tendo em vista as suas implicações para a revisão e proposição de teorias e metodologias no campo da comunicação.
Este curso será ministrado pelos professores Fernanda Bruno, Erick Felinto e Simone Pereira de Sá, constituindo uma parceria entre os PPGCOMs da UFRJ, UERJ e UFF.
Bibliografia Básica: 
Latour, B. Reflexão Sobre o Culto Moderno dos Deuses Fe(i)tiches. EDUSC, 2002.
____________ Reassembling the Social – An Introduction to Actor-Network-Theory. Oxford University Press, 2005.
_____________ Cogitamus: six lettres sur les humanités scientifiques. La Découverte, 2010.
Callon, M.; Lascoumes, P.; Barthe, Y. Acting in an Uncertain World: An Essay on Technical Democracy. MIT Press, 2009.
Akrich, M.; Callon, M.; Latour, B. (Orgs.). Sociologie de la Traduction: textes fondateurs. Paris: Mines Paris, 2006.
Michel Foucault. A Arqueologia do Saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1987.
_______________. A Ordem do discurso. São Paulo: Loyola, 1996.
Gilbert Simondon. L’individuation psychique et collective. Aubier, 1989.
____________________. Du Mode d’Existence des Objets Techniques. 
Gumbrecht, Hans Ulrich - Produção de Presença - o que o sentido não consegue transmitir. Contraponto/PUC-Rio, 2010, Rio de Janeiro
Bryant, L.; Srnicek, N.; Harman, G. (eds.). The Speculative Turn: Continental Materialism and Realism. Re.Press, 2011.

PROGRAMA
15/03 - Apresentação Curso
22/03 – A vida secreta dos objetos. Um novo paradigma? [Introdução geral]
Professores responsáveis: Erick Felinto, Fernanda Bruno, Simone Pereira de Sá
TEXTO-AULA: Shaviro, Steven. The Universe of Things (texto retirado de seu blog, em http://www.shaviro.com/Blog/?p=893)
TEXTOS COMPLEMENTARES:
Bryant, L.; Srnicek, N.; Harman, G. (eds.). The Speculative Turn: Continental Materialism and Realism. Re.Press, 2011.
Gumbrecht, Hans Ulrich - Produção de Presença - o que o sentido não consegue transmitir. Contraponto/PUC-Rio, 2010, Rio de Janeiro
Akrich, M.; Callon, M.; Latour, B. (Orgs.). Sociologie de la Traduction: textes fondateurs. Paris: Mines Paris, 2006.
29/03 - A vida secreta dos objetos. Na contra-mão da hermenêutica I. [Benjamin]
Professor responsável: Erick Felinto 
TEXTO-AULA: “Sobre a Linguagem em Geral e Sobre a Linguagem dos Homens” – Walter Benjamin (em Escritos sobre Mito e Linguagem. São Paulo: Duas Cidades, 2011)
TEXTOS COMPLEMENTARES: Busch, Kathrin. “The Language of Things and the Magic of Language On Walter Benjamin’s Concept of Latent Potency”. In Transversal, n. 15, 2010.
12/04 - A vida secreta dos objetos. Na contra-mão da hermenêutica II. [Foucault]
Professor responsável: Fernanda Bruno
TEXTO-AULA: Foucault, M. Arqueologia do Saber: Cap. III.4 “Raridade, exterioridade, acúmulo” e CAP III. 5 “O a priori histórico e o arquivo”.
TEXTOS COMPLEMENTARES:
Nietzsche, F. A genealogia da Moral. São Paulo: Cia das Letras, 1998.
Foucault, M. Nietzsche, Freud, Marx. São Paulo: Princípio, 1997
_____________. A ordem do discurso. São Paulo: Loyola, 1996
_____________. A hermenêutica do sujeito. São Paulo: Martins Fontes, 2006
Dreyfus, H. L. & Rabinow, P. Michel Foucault: Beyond Structuralism & Hermeneutics. Chicago: University of Chicago Press, 1982.
19/04 - O tempo dos objetos: Jamais fomos modernos. [Latour]
Professor responsável: Fernanda Bruno
TEXTO-AULA: Latour, B. Jamais Fomos Modernos. Rio de Janeiro: 34 letras, 1994.
TEXTOS COMPLEMENTARES:
Heidegger, M. “La question de la technique”. In: Essais et Conférences. Paris: Gallimard, (1958) 1990.
Latour, B. Reflexão Sobre o Culto Moderno dos Deuses Fe(i)tiches. EDUSC, 2002.
26/04 - Materialidades: teoria da mídia alemã [Kittler]
Professor responsável: Erick Felinto 
TEXTO-AULA: Winthrop-Young, Geoffrey & Gane, Nicholas. “Friedrich Kittler: an Introduction”. In Theory, Culture and Society, n. 23. 2006.
TEXTOS COMPLEMENTARES: Winthrop-Young, Geoffrey. “Media Theory”. In. Kittler and the Media. London: Polity, 2011.
03/05 – Materialidades: comunicação e presença [Gumbrecht]
Professor responsável: Simone Pereira de Sá; Erick Felinto
TEXTO-AULA: Introdução e caps “Para além do sentido: posições e conceitos em movimento” e “Epifania/prentificação/ Dêixis: futuros para as humanidades e as Artes.” do livro : “Produção de Presença - o que o sentido não consegue transmitir” - Gumbrecht, Hans Ulrich. Contraponto/PUC-Rio, 2010, Rio de Janeiro
TEXTOS COMPLEMENTARES: Gumbrecht, Hans Ulrich - Corpo e Forma. Ensaios para uma crítica não-hermenêutica. Org: João Cesar de Castro Rocha. Rio de Janeiro, EDUERJ, 1998;
Gumbrecht & PFEIFFER, Ludwig – Materialities of Communication. Stanford. Stanford Univ Press, 1994
Pereira, Vinicius Andrade - Reflexões sobre as materialidades dos meios: embodiment, afetividade e sensorialidade nas dinâmicas de comunicação das novas mídias. Revista Fronteiras VII(2): 93-101, mai-ago de 2006
10/05 – Materialidades: teoria ator-rede [M. Callon; B. Latour; J. Law]
Professor responsável: Fernanda Bruno
TEXTO-AULA: 
Latour, B. Reassembling the Social – An Introduction to Actor-Network-Theory. Oxford University Press, 2005.  Introdução e Parte I, Cap 3: Third Source of Uncertainty: Objects too Have Agency)
Callon, M.; Law, J. After the individual in society: lessons on collectivity from science,technology and society. In: Canadian Journal of Sociology, Spring, v22, i2, p165-82, 1997
TEXTOS COMPLEMENTARES: 
Latour, B. “Technology is society made durable”. In: LAW, J. (Org.). A sociology of monsters: essays on power, technology and domination. Londres: Routledge, 1991.
_________. “Les ‘vues’ de l’esprit: une introduction à l’anthropologie des sciences et des techniques”. In: BOUGNOUX, D. (Org) Textes essentiels – Sciences de l’Information et de la Communication. Paris : Larousse, 1993.
________. On interobjectivity. Mind, Culture, and Activity 3 4 (1996).  228-245.
17/05 – O tempo dos objetos: arqueologia da mídia. [Zielinski – Arqueologia da Mídia; Parrika]
Professor responsável: Erick Felinto 
TEXTO-AULA: Zielinski, Siegfried. “Introduction: the Idea of a Deep Time of the Media”. In: Deep Time of the Media: Toward an Archaeology of Hearing and Seeing by Technical Means. Cambridge: the MIT Press, 2006.
TEXTOS COMPLEMENTARES: Parikka, Jussi & Huhtamo, Erkki. “Introduction”. In: Media Archaeology: Approaches, Applications, and Implications. Berkeley: University of California Press, 2011.
24/05 - O tempo dos objetos: para além dos velhos e novos sentidos [Lisa Gitelman + Sterne]
Professores responsáveis: Erick Felinto e Simone Pereira de Sá
TEXTO-AULA: Gitelman, Lisa - Always already new – Media, History and the data of culture. Intro. (Media as Historical Subjects)  e parte 1 (The case of Phonographs – pg (25-88)
TEXTOS COMPLEMENTARES:
Sterne, Jonathan –  STERNE, Jonathan – The Audible Past. Cultural origins of sound reproduction. Duke University Press, Durham and London, 2003. Introd. e Cap 1  “Machines to hear for Them”. Pp 1-86
31/05 – Mediação: agência, delegação, tradução [Bruno Latour; Michel Serres]
Professor responsável: Fernanda Bruno
TEXTO-AULA: Latour, B. On Technical Mediation: philosophy, sociology, genealogy. Common Knowledge, n° 2, v. 3, Oxford University Press, 1994.
TEXTOS COMPLEMENTARES:
Latour, B. From Realpolitik to Dingpolitik: or How to Make Things Public
Serres, M. Luzes. São Paulo: Unimarco, 1999
__________. Theory of the Quasi-Object. In The Parasite. Londres: John Hopkins University Press, 1982.
21/06 – Mediação: uma filosofia do medium [S. Krämer]
Professor responsável: Erick Felinto 
TEXTO-AULA: Friesen, Norm & Hug, Theo. The Mediatic Turn: Exploring Concepts for Media Pedagogy. In: Lundby, K (org.). Mediatization: Concept, Changes, Consequences. New York: Peter Lang, 2009.
TEXTOS COMPLEMENTARES: Krämer, Sybille. “Does the Body Disappear? A Comment on Computer Generated Spaces”.
28/06 – Mediação: música e amadores [Sterne; Hennion]
Professor responsável: Simone Pereira de Sá e Fernanda Bruno
TEXTO-AULA:
Hennion, A. Music and Mediation: Towards a new Sociology of Music in The Cultural Study of Music: A Critical Introduction. 2002. M. Clayton, T. Herbert, R. Middleton eds. London: Routledge.
Sterne, J – O MP3 como artefato cultural. In: Sá, Simone Pereira de (org.) Rumos da Cultura da Música. Negócios, estéticas, linguagens e audibilidades. Ed. Porto Alegre, Ed Sulina, 2010.
TEXTOS COMPLEMENTARES:
05/07 – Fechamento
Metodologia
As aulas serão ministradas alternadamente pelos professores Fernanda Bruno, Erick Felinto e Simone Pereira de Sá. Conforme previsto no programa, cada professor ficará responsável pela apresentação de uma temática específica, seguida de debate entre os três professores e os alunos.
Para cada aula, um aluno ficará responsável pelo relato e organização das referências bibliográficas mencionadas no dia.