quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Didi-Huberman: espetáculo, dor e histeria


Robert-Fleury, Pinel délivrant les folles de la Salpêtrière, 1795
"Je tente, au fond, de rouvir cette question: qu'aura pu signifier le mot "spectacle" dans l'expression "spectacle de la douleur"? C'est une infernale question, je crois, aiguë, stridente, intimement.
Ainsi, comment dans notre approche des oeuvres, des images, un rapport à la douleur se trouve-t-il como déjà projeté? [...]
Je n'aurait pu finalement que nommer douleur cet événement, l'hystérie. Et dans le passage même de son terrible attrait (et c'est là que s'ouvrait d'abord la question).
J'interroge ce paradoxe d'atrocité: l'hystérie fut, à tous moments de son histoire, une douleur mise en contrainte d'être inventée, comme spactacle et comme image; elle allait jusqu'à s'inventer elle-même (sa contrainte était son essence) lorsque faiblissait le talent des fabricateurs patentés de l'Hystérie. une invention: un événement des signifiants. Mais dans lévénement même des douleurs, des trop évidentes douleurs hystériques, je voudrais parler du sens de leur extême visibilité".
Trechos da abertura do livro Invention de L'Hystérie, de Georges Didi-Humerman (Paris: Macula, 1982)
Noutra ocasião, postei aqui sobre esse belíssimo livro.

domingo, 14 de setembro de 2008

Self Surveillance


A modernidade nos ensinou que a auto-vigilância é uma das formas de interiorização da lei, da norma ou do olhar do Outro; nessa medida e sentido confunde-se com a própria constituição da subjetividade moderna, mais especificamente da consciência moral, do superego.
A atualidade inventa uma outra modalidade de auto-vigilância, que não anula a anterior, mas é de outra "natureza". O Fitbit é um dos exemplos de uma outra auto-vigilância, que é tecnicamente assistida e em vez de ter o peso da consciência, cabe na palma da mão ou no bolso. Seu objeto não são desejos e pensamentos, mas sobretudo a performance corporal. Já postei sobre outras engenhocas do gênero, que poderia ser incluído na categoria de "personal health monitoring". O Fitbit monitora os movimentos do seu usuário 24 horas por dia, registra e relata seus passos, distâncias percorridas, gastos calóricos e a qualidade do seu sono. Tais relatórios podem ser transferidos para a Internet e monitorados pelo próprio usuário ou por seus amigos e familiares, uma vez que o Fitbit permite a criação de uma rede social, introduzindo o olhar do outro no jogo (via Technology Review).

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Fausto


"FAUST: By spying, your all-knowing wit is warmed?
MEPHISTOPHELES: Omniscient? No, not I; but well-informed".
Goethe, Fausto

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Rastreadores pessoais portáteis


Adaptações do GPS para o rastreamento personalizado constituem uma das "novidades" no mercado brasileiro da segurança pessoal, onde recebe o nome de rastreador pessoal portátil ou localizador pessoal portátil. Alguns desses, como o GPS com Chipset SiRF Star III da Rota Segurança/Plastimon, não apenas permitem a localização instantânea de seus usuários mesmo em lugares fechados, como têm uma série de outras funções, como envio de mensagens pré-programadas de emergência, ou a função "parking", voltada ao monitoramento de veículos e que envia mensagem SMS para o celular do usuário no caso de movimentação do veículo. Além disso, o monitoramento do aparelho/pessoa pode ser feito pela Internet e vem sendo direcionado para homens e mulheres que desejam ser rastreados como para crianças, doentes, animais e bens de estimação.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Medo e espetáculo


London, Metro

"The Passion to be reckoned upon, is Fear" (Hobbes, Leviathan)
No último post mencionei a relação entre espectáulco e medo, retomada por Jonathan Crary do Império (Record, 2001) de Negri e Hardt. Voltei a este livro em busca das passagens que tratam disso e compartilho aqui, com grifo meu:
"A sociedade do espetáculo governa com uma arma antiquíssima. Hobbes reconheceu há muito tempo que, para a dominação efetiva, "a Paixão a ser examinada é o Medo". Para Hobbes, é o medo que une e assegura a ordem social, e ainda hoje o medo é o mecanismo principal que enche a sociedade do espetáculo. Embora o espetáculo pareça funcionar por meio do desejo e do prazer (o desejo de mercadorias e o prazer do consumo), ele realmente funciona pela comunicação do medo - ou ainda, o espetáculo cria formas de desejo e prazer intimamente casadas ao medo" (p. 344).
"O que está por trás das diversas políticas das novas segmentações é uma política de comunicação. Como argumentamos antes, o conteúdo fundamental das informações que as enormes empresas de comunicação apresentam é o medo. O constante medo da pobreza e a ansiedade sobre o futuro são as chaves para criar entre os pobres uma disputa pelo trabalho e manter o conflito no proletariado imperial. O medo é a garantia definitiva das novas segmentações" (p. 360)

A frase em grifo é fundamental para se entender as ambiguidades das novas formas de vigilância na atualidade e suas relações com o desejo e o prazer. Tais ambiguidades podem sempre ser apropriadas pelo controle, como inscreve cinicamente o selo "Sorria, você está sendo filmado". Mas são essas mesmas ambiguidades que constituem, contudo, o território instável e intersticial de onde podem emergir as resistências e criações possíveis.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Conjurations of Security

Acabo de ler um pequeno artigo do Jonathan Crary sobre segurança e violência na América após o atentado de 11 de setembro de 2001 ("Conjurations of Security". Interventions, vol 6(3), 2004). Ressalto dois argumentos que me interessaram especialmente, uma vez que incrementam as pistas para o meu empenho em pensar conjuntamente os circuitos do espetáculo, do entretenimento, do voyeurismo e do prazer e os circuitos do controle e da vigilância. O primeiro argumento é mais amplo e emprestado do Negri e do Hardt: no Império, o espetáculo não funciona apenas pelo desejo de mercadorias e o prazer do consumo, mas principalmente pela comunicação do medo. O segundo argumento, mais específico e muito oportuno, mostra o quanto há de aparência e denegação no caráter exterior, estrangeiro e bárbaro que os Estados Unidos atribuem aos ataques suicidas. Crary chama a atenção para a inconfessa proximidade entre estes e os assassinos suicidas norte-americanos e seus homicídios em massa que se tornaram especialmente recorrentes a partir dos anos 1980. Diferentemente dos primeiros, tais ataques suicidas domésticos, diz Crary, são "tolerados como um fenômeno aberrante e inexplicável". Prossegue: "But it is the monsters from elsewhere, from outside that we are told to fear most".

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Reality Family Show


Reality shows expondo a vida e os conflitos familiares já são lugar comum na televisão mundial ocidental. O que me chamou atenção nessa nova série de reality shows em que famílias serão filmadas por 21 câmeras (assitidas de 16 microfones) em suas casas ao longo de quatro meses é o tom "científico-assistencialista" do programa que será exibido no Channel 4. Paralelamente ao reality "The family", o canal exibe uma série de enquetes e pesquisas com dados estatísticos sobre o estado da família contemporânea na Inglaterra. O programa é categorizado pelo canal como documentário e não como reality show. Uma composição de vídeo-vigilância, espetáculo e laboratório sócio-comportamental que vem se tornando comum em diversos setores.

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

São Paulo, Metrô e Vigilância


O Metrô de São Paulo terá câmeras de vigilância no interior dos vagões. A previsão é que até o final de 2009 todos os vagões da Linha 2-Verde sejam monitorados. Até 2014, todos os veículos das Linhas 1-Azul e 3-Vermelha também terão sistemas de vídeo-vigilância (Via Portal do governo de SP). Além do interior dos vagões, as estações de metrô de São Paulo já contam com 860 câmeras que monitoram 55 estações. Em todo o mundo, o controle da mobilidade urbana tem como um de seus instrumentos privilegiados a vídeo-vigilância em transportes públicos. Ainda em São Paulo, todos os trens metropolitanos de três linhas da CPTM também serão monitorados por câmeras.