sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Multiversos e cosmogramas (Quarta Carta de Cogitamus, Bruno Latour)

Um outro cosmos: multiversos, cosmogramas. São dessas outras "cosmologias" que trato brevemente nessa nota sobre a quarta carta do livro Cogitamus, de Bruno Latour. O ponto de partida é o belo livro de A. Koyré, Do mundo fechado ao universo infinito, o qual coincidentemente foi determinante na formação do meu entendimento da modernidade, ainda na graduação de uma psicologia fortemente afinada à epistemologia. Entendimento que, diz Latour, deve hoje ser revisto por pelo menos duas razões. Primeiro, porque essa passagem - do mundo fechado de Aristóteles e dos medievais ao universo infinito da ciência moderna de Galileu e Laplace - jamais se deu efetivamente. Ela é aquilo mesmo que caracteriza a narrativa moderna como ruptura com um passado primitivo e equivocado em direção a um futuro em posse da verdade e, no mínimo, promissor. Na sua contra-história da modernidade e da filosofia da ciência, Latour afirma que simplesmente passamos de um cosmo a outro, com a diferença de que este se acreditava um universo. Esta crença, contudo, não a temos mais. Eis a segunda razão da revisão do entendimento suposto no livro de Koyré. O século XXI não mais tem a certeza de viver num universo infinito. As discussões sobre ecologia e mudanças climáticas, por exemplo, nos advertem que temos agora que negociar não apenas entre nós, humanos, mas também com os recursos finitos da natureza. Mas não retornarmos ao cosmos aristotótico. Habitamos multiversos (retomando o termo do W. James). Ou ainda, habitamos um outro cosmos, mas este deve ter o sentido que habitualmente lhes dão os antropólogos: o agenciamento de todos os seres que uma cultura particular mantém juntos nas formas de vida prática. Apreender este outro, nosso, cosmos implica reconstituir "cosmogramas" (J. Tresch), sempre traçados seguindo as diferentes partes envolvidas nas controvérsisas que o constitui. "Descrever associações de conveniência, de coexistência, de oposição e de exclusão entre seres humanos ou nào humanos cujas condições de existência são pouco a pouco explicitadas sob a prova das disputas...Traçar cosmogramas é se tornar sensível a essas listas de associações e duelos lógicos sem recorrer à distinção do racional e do irracional, do moderno e do arcaico, do sistemático e do "bricolé".
Essa sensibilização para modos de existência diversos e para a natureza heterogênea e controversa do que entendemos por "mundo", "cosmos" ou "universo" é especialmente provocativa para quem, como eu, tem uma formação em ciências humanas e em particular em psicologia. A acolhida desta perspectiva no campo reconhecidamente híbrido da comunicação é menos controversa, creio. Mas o que julgo mais interessante nestas belas idéias e imagens de multiversos e cosmogramas, é que elas permitem não apenas uma reflexão diferenciada das ciências humanas e sociais sobre a ciência e a tecnologia, mas também conexões pouco usuais entre o cosmos assim entendido e a política. Cosmopolíticas, como se verá em post próximo.

Ps: Lamento pela pelo caráter pouco didático deste post, que merecia explicações mais detalhadas para ser plenamente compreendido. Tomem-no como pistas e traços a serem percorridos e continuados.

4 comentários:

Anônimo disse...

Il semble que vous soyez un expert dans ce domaine, vos remarques sont tres interessantes, merci.

- Daniel

Fernanda Bruno disse...

Merci à vous d'avoir la patience et l'intérêt de lire ce blog écrit en langue mineur.
Fernanda

Francisco Arlindo Alves disse...

Voce não precisa explicar tudo. As são necessárias apenas umas pistas.

Francisco Arlindo Alves disse...

Não precisa explicar tudo. São necessárias apenas umas pistas. (correção)